O pior caso é o da Unis Norte, em Linhares, onde vivem 243 jovens, num espaço com apenas 90 vagas
De acordo com matéria do jornal A Gazeta, das 13 unidades de internação para adolescentes no Estado, só em quatro delas não há superlotação. Um excesso que supera os 39%. Atualmente o sistema possui 754 vagas, mas abriga 1.198 menores. A situação é mais complicada em três locais, considerados “barris de pólvora”: Unis Norte e Unip Norte, ambas em Linhares, e Unip II, em Cariacica.
Nas três, a quantidade de menores internados equivale a duas vezes e meia a capacidade das unidades. “A superlotação causa diversos problemas. Os serviços não são prestados, gerando uma grande instabilidade e brigas entre eles. E pode explodir a qualquer momento”, relata a defensora pública Olívia Sofiato.
Dados
O levantamento foi feito por A GAZETA, com base em números obtidos em documentos do governo estadual e junto à Defensoria Pública do Estado, cujo Núcleo da Infância faz o acompanhamento das unidades de internação de menores.
O Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases) apresenta, sem detalhar as informações, números um pouco menores, mas que também revelam uma superlotação. Informa que possui 758 vagas, para 1.058 internos. São 300 jovens a mais do que a capacidade das unidades.
O pior caso é o da Unis Norte, em Linhares, onde vivem 243 jovens, num espaço com apenas 90 vagas. Lá, garantem os defensores, há uma total violação dos direitos humanos, onde falta desde um atendimento digno a educação, desrespeitando o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “Estão potencializando a parte destrutiva destes jovens”, assinala Hugo Fernandes Matias, coordenador do Núcleo da Infância.
Em Linhares também é muito complicada a situação da Unip Norte, que conta com 70 vagas e abriga 154 menores em condição provisória, que ainda não tiveram sua situação definida pela Justiça estadual.
Uma situação, inclusive, que levou o juizado da 2ª Vara da Infância e Juventude de Linhares a proferir uma sentença em uma ação do Ministério Público Estadual. Ele determinou que o Estado construa duas unidades de internação – uma provisória e uma definitiva –, sob pena de multa, na Região Norte. O processo está agora no Tribunal de Justiça.
Cinco adolescentes mortos em quatro anos
Nos últimos quatro anos, um total de cinco adolescentes morreram nas unidades de internação do Estado. Três destes casos foram registrados na Região Norte, justamente nos locais que apresentam a maior superlotação.
As mortes na Unis Norte ocorreram nos anos de 2013, 2014 e 2016. Uma em cada ano, segundo a Defensoria Pública. Na última delas um interno foi espancado até a morte. O crime teria sido cometido por companheiros de alojamento da vítima, que tinha 20 anos e cumpria medida socioeducativa.
Uma unidade onde, só em 2015, segundo matéria divulgada pela TV Gazeta, foram registradas 62 fugas e 14 motins.
Facções
Outro problema é a presença de facções criminosas. “Os menores não gostam muito de falar sobre o assunto, que é tratado de forma velada”, relata Camila Ferreira.
Mas na chegada às unidades todos passam por uma entrevista de triagem e são separados por grupos a que pertencem. “Não ficam no mesmo alojamento, é a regra. Podem ter contato no banho de sol, monitorados por muitos agentes”.
Jovens sem aulas em sete unidades
Em sete das unidades de internação do Estado há adolescente sem ir à escola. O problema é mais grave justamente nos locais onde é registrado uma superlotação mais expressiva. É o caso da Unis Norte e Unip Norte, em Linhares, e a Unip II, em Cariacica.
Nas duas unidades de Linhares, cerca de um terço dos adolescentes estão fora das salas de aula – são 72 sem vagas da Unis Norte e outros 42 na Unip Norte. Um desrespeito severo ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), como pondera a defensora pública Olívia Sofiato. “Muitos não têm acesso à educação como está previsto no ECA. Sem ela, vai por terra todo o trabalho que poderia ser feito com estes jovens”, assinala.
Os dados, solicitados pela própria Olívia às unidades, revelam que na Unip II, outra unidade que também sofre com o excesso de internos além de sua capacidade, também não consegue atender a todos os adolescentes. Lá, 41 estão sem acesso as aulas. “Há situações de faltas de vagas, outras de agente para levar os internos até as salas. Problemas causados pela superlotação”, pondera a defensora Camila Ferreira.
Segundo a defensora Olívia, não há informações ainda sobre as unidades de semiliberdade localizadas em Vila Velha e na Serra.
Objetivo é desafogar o regime fechado
A diretora-presidente do Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases), Alcione Potratz, reconhece que algumas unidades de internação estão superlotadas, incluindo as de Linhares. Mas assinala que as atividades pedagógicas e profissionalizantes não estão deixando de ser oferecidas.
Mas ainda não há intenção, segundo ela, de construir novas unidades. O foco do Iases, explica, é trabalhar em outras alternativas que não sejam o encarceramento dos jovens. “Queremos trabalhar, em parceria com outros setores, medidas alternativas à apreensão, em meio aberto, mais humanizadas”, assinala.
Uma destas propostas é a ampliação da semiliberdade da Região Norte. A intenção, ainda, é que o mesmo ocorra na Grande Vitória. Em todos os locais, a direção do Iases quer envolver os municípios nas discussões. “A internação deve ser a última das medidas adotadas em relação a um adolescente”, pontua a diretora.
Alcione destaca que, nas unidades provisórias, há uma rotatividade muito grande. São locais onde o adolescente tem que, em 45 dias, ter o seu processo julgado pela Justiça. “Se recebe uma internação, vai para uma unidade definitiva, caso contrário, pode ser liberado”.
Segurança
De acordo com a diretora, não há indicativos de que as rebeliões ocorridas na sistema prisional de adultos na Região Norte do Brasil possam ter qualquer repercussão nas unidades capixabas.
Ela destaca que são feitas revistas periódicas e acompanhamento individual dos adolescentes e do contexto familiar e social, trabalho executado pelas equipes de inteligência do Iases.
Quanto a presença de facções criminosas nas unidades, ela descarta. “Não temos nenhum registro formal nas unidades”, assinala, lembrando que há um acompanhamento individualizado de cada adolescente quando entra nas unidades.
Destaca, ainda, que no final do ano o monitoramento da instituição é feito com mais rigor, e que ele tem sido mantido. Sobre a presença de adolescentes que se intitulam como xerifes, ela explica que há um acompanhamento por parte dos agentes.